Você, provavelmente, sabe que a reforma trabalhista trouxe importantes inovações, mas você sabia que foi criada a figura do empregado hipersuficiente e que isso permite uma série de vantagens tanto para o empregado como para o empregador? 

Sobre a negociação entre empregado e empregador antes da reforma trabalhista

O Direito do Trabalho desde seus primórdios buscou uma maior proteção ao empregado, sendo este considerado a figura hipossuficiente da relação de emprego, o que justificaria uma maior proteção. Em razão dessa condição menos favorecida, a lei garante uma série de prerrogativas que, em regra, são indisponíveis e inegociáveis, não podendo, portanto, o empregado negociar os seus direitos diretamente com seu empregador.

A legislação até permite que alguns instrumentos flexibilizem leis trabalhistas, dentre os quais citam-se as convenções coletivas e os acordos coletivos. Tais mecanismos possibilitaram resguardar a negociação dos direitos trabalhistas do empregado, contudo, como é exigido a presença do sindicato da categoria em questão, a negociação se torna arrastada e muitas vezes não leva em conta particularidades da empresa ou do empregado.

Sendo assim, até então, pela sua presumida hipossuficiência, o empregado, independentemente de sua remuneração e grau de instrução, não poderia negociar os seus direitos diretamente com seu empregador sem a intervenção de seu sindicato.

Contudo, em 2017, com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/17), os chamados empregados hipersuficientes ganharam a tão sonhada autonomia para negociar os seus direitos diretamente com o empregador, sem a necessidade de tal negociação ocorrer por meio de convenções coletivas e acordos coletivos, que pressupõem a intervenção do sindicato.

Mas, quem são eles? Quais as características pra ser considerado um empregado hipersuficiente? O que é possível negociar? Para responder tais questionamentos, é necessária a análise do parágrafo único do artigo 444 da CLT em conjunto com o artigo 611-A, também da CLT.

O que é um empregado hipersuficiente e quais as suas características?

Para compreender melhor a figura do empregado hipersuficiente, deve-se, inicialmente, compreender o que é um empregado nos termos da legislação trabalhista. 

De acordo com o artigo 3º da CLT, para ser considerado empregado, é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: ser pessoa física, prestar serviços de forma não eventual, estar subordinado ao empregador e ser remunerado com salário.

Já, para ser considerado empregado hipersuficiente, necessário se faz o preenchimento de três requisitos: 

  1. ser empregado, nos termos do artigo 3º da CLT; 
  2. ter diploma de ensino superior; e, 
  3. ter salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Esses são os requisitos estabelecidos no artigo 444, parágrafo único da CLT:

Art. 444 – As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social

De forma mais simplificada, para ser hipersuficiente é preciso que o indivíduo seja empregado, nos termos do artigo 3º da CLT, possua diploma de ensino superior e ganhe a partir de R$ 14.174,44.

O empregado que se enquadra nessa categoria tem autonomia para negociar o seu contrato de trabalho diretamente com o empregador, já que possui “maior capacidade” de se impor frente às negociações. Contudo, é de se observar que essa liberdade só alcança uma pequena parcela dos empregados, já que a maioria deles é composta por aqueles que ganham remunerações bem menores do que o estipulado para o hipersuficiente.

Quais são os direitos trabalhistas que os empregados hipersuficientes podem negociar?

Conforme dito acima, os empregados hipersuficientes podem negociar diretamente com o empregador direitos trabalhistas, já que não dependem da anuência de sindicatos ou convenções coletivas. Contudo, não são todos os direitos trabalhistas que podem ser negociados pelo empregado hipersuficientes.

Os direitos trabalhistas que podem ser negociados pelo empregado hipersuficiente diretamente com o empregador, foram estabelecidos no artigo 611-A da CLT, dentre os quais, cita-se os principais:

  • Jornada de trabalho;
  • Banco de horas;
  • Intervalo para almoço;
  • Teletrabalho;
  • Sobreaviso;
  • Trabalho intermitente;
  • Remuneração por produtividade;
  • Troca de feriado;
  • Adesão ao Programa Seguro Emprego (PSE);
  • Enquadramento do grau de insalubridade;
  • Prorrogação de jornada em ambientes insalubres;
  • Prêmios de incentivo em bens ou serviços;
  • Participação nos lucros ou resultados da empresa, dentre outros.

Ou seja, a existência de empregados hipersuficientes permite uma maior flexibilidade e criatividade na forma que se dará a relação de trabalho, podendo estes negociarem livremente os direitos acima citados, sem a interferência e assistência do sindicato, respeitando as disposições de proteção ao trabalho, os contratos coletivos aplicáveis e as decisões das autoridades competentes. 

Assim, é possível sofisticar e até mesmo desonerar a remuneração dos empregados hipersuficientes, por meio da redução dos encargos trabalhistas e previdenciários que tanto oneram o salário do empregado, o que pode ocorrer, por exemplo, através da introdução de um Programa de Participação nos Lucros e Resultados (“PLR”).

Interessante registrar que os valores recebidos a título de PLR, não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista, não havendo de se falar na habitualidade, o que também afasta as contribuições previdenciárias. 

Destaca-se também que, quando da apuração do lucro real as participações distribuídas poderão ser deduzidas como despesa operacional e, sob a perspectiva do empregado, o Imposto de Renda da Pessoa Física também será beneficiado conforme tabela própria.

Além da autonomia nas negociações de direitos trabalhistas, a Reforma Trabalhista também possibilitou que os empregados hipersuficientes ajustem um termo de compromisso arbitral para resolver eventuais conflitos com seu empregador, tal como dispõe o artigo 507-A da CLT.

Por fim, se registra que profissionais com características semelhantes às dos empregados hipersuficientes podem ser contratados como pessoa jurídica com uma melhor aceitação, incorrendo em menor risco de ser configurada a denominada “pejotização fraudulenta”. Esse foi o entendimento do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da Reclamação, nº 47843, no qual restou decidido que tal escolha e meio de contratação, ​realizada por pessoas com alto nível de formação, não afronta a legislação trabalhista, podendo ser utilizada por professores, artistas, locutores e outros profissionais que não se enquadram na situação de hipossuficiência.

E salienta-se que não deve ocorrer a demissão de empregados hipersuficientes, com a imediata contratação desse profissional como pessoa jurídica. O prazo de 18 meses entre a demissão do empregado celetista e a contratação mediante pessoa jurídica, estabelecido no artigo 5º-C da Lei 6.019/74, deve ser respeitado.

Conclusão

A criação da figura do empregado hipersuficiente pela Lei 13.467/17, com consequente autonomia para negociar seus direitos diretamente com o empregador, criou uma interessante e pioneira alternativa que possibilita a negociação de condições contratuais  diferenciadas e sob medida com empregados estratégicos que ocupam diferenciadas posições na hierarquia da empresa.      Dessa forma, possibilita-se uma maior assertividade do contrato de trabalho, inclusive, com redução de encargos trabalhistas e tributários.

Assim, as cláusulas entabuladas entre o empregado hipersuficiente e o empregador passam a ter a mesma eficácia legal e predominância sobre os instrumentos coletivos e a legislação trabalhista. Gerando assim, maior segurança para as partes, principalmente para o empregador, bem como estabilidade nas relações trabalhistas. 

Ainda que de livre contratação e autonomia para estipulação das cláusulas, é muito importante contar com uma assessoria jurídica para auxiliar na negociação e elaboração do contrato, a fim de que sejam respeitados todos os requisitos exigidos pela lei.

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Mestre em Instituições Sociais, Direito e Democracia pela FUMEC na linha de pesquisa de Direito Privado: Autonomia Privada, Regulação e Estratégia Especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito Milton Campos e Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela FEAD. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos.

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Bacharel em Direito pela UNA, Pós-Graduanda em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Escola Superior de Advocacia.

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